Acerca da solidão


O universo dos seres humanos é um universo entrelaçado; vale dizer que todos estão ligados a todos. E, no entanto, tantas vezes faz-se um vazio tão grande dentro do indivíduo que parece nada existir à volta. É como viver isolado no imenso espaço cósmico frio e escuro. Que estranho fenómeno é este?

O mundo causal em que nos movemos é o dos pensamentos, das energias psíquicas. O mundo das formas é de aparências que cada um vê conforme a realidade que vive, seja de modo temporário ou permanente. Uma paisagem é colorida se for vista com olhos de alegria, e cinzenta se for vista com olhos de tristeza.

Sendo verdadeiro e real que nunca ninguém está só, em virtude da imersão num caldo de forças mentais, constantemente alimentado e em trocas permanentes, que sucede então para que, uma vez ou outra e de forma mais ou menos prolongada, nos sintamos uma ilha no meio de nada?

Repare-se que é diferente estar só e sentir-se só. Estar só é solitude, e tem a ver com uma escolha consciente, e sentir-se só é solidão, e simplesmente acontece. Na solitude o indivíduo faz como que um silenciamento para se encontrar (e eventualmente dar origem a processos criativos), ao passo que na solidão o ruído impõe-se de tal forma que o indivíduo não consegue escutar-se a si próprio. Digamos que se dissocia e que perde a sua identidade no todo. E se não consegue identificar-se nesse todo é como se não existisse. É o caos, é o vazio, é a redução a nada.

Todavia, a solitude pode levar à solidão. Estar em solitude por egoísmo, sem uma actividade que ligue aos outros, e chegar a casa e só ter um cão ou um gato com quem partilhar a vida, pode facilmente conduzir a um estado de solidão. (Houve um escritor, e agora não me lembro quem para lhe atribuir a frase, que escreveu que solidão não é estar só mas estar vazio.)

Não é pela fuga do mundo que se purifica a alma porque isolada não se burila na luta (a esquizofrenia e o autismo são fugas de si próprio), e se há anacoretas que a igreja católica fez santos, resta saber quantos não ficaram loucos. Porque a extrema solidão enche o espírito de muitas companhias, as que pululam na imaginação e as que têm vontade e inteligência próprias.

Também é simbólico neste aspecto as tentações de Jesus no deserto, porque a extrema solitude desperta demónios interiores. É improvável que tal episódio tenha acontecido (há uma clara semelhança com as tentações de Buda. São episódios fictícios que visam ilustrar uma ideia), mas o escriba fez uma bela interpretação psicológica da solidão.

Ora isto remete-nos de imediato para a questão das sintonias.

Estando o universo em que nos movemos saturado de ondas (eléctricas, magnéticas, e as mentais, que podendo participar da natureza electromagnética tem todavia algo que delas difere porque polarizadas por aquilo que chamamos de emoções e sentimentos), ondas que por simpatia sintonizamos e que vão ter uma acção de ressonância naquilo que já carregamos interiormente.

Somos energia, não há volta a dar. E como energia que somos a todo o momento interagimos com outras energias. A todo o momento influenciamos e somos influenciados. Qualquer electrão que salte da órbita produz uma alteração de estado. Da mesma forma que se produzem alterações no estado físico, assim também nos estados psíquicos, ou espirituais. O princípio é o mesmo. As leis que regem o universo físico e as leis que regem o universo não-físico são similares. Se não guardassem similitude o material e o espiritual não agiam um sobre o outro. E o facto é que agem.

E é facto também que o nosso nível vibracional é de baixa frequência. Ora, juntando-se duas ou mais baixas frequências, o tónus daqueles que as partilham não pode ser elevado. Aplica-se aqui o adágio “mais vale só que mal-acompanhado”. É menos prejudicial à saúde a solidão que a toxicidade de certas pessoas. Quem nunca se sentiu adoecido por certas companhias? Ou sugado? O sistema de trocas energéticas é fascinante como objecto de estudo, que tanto pode dar para o melhor, como sensação de bem estar até às curas, quanto para o pior, como sensação de mal-estar até à doença grave.1

Quando se eleva a frequência vibratória, até próximo das ondas curtas, entra-se em estados mentais e emocionais superiores, logo, a sensação de completude. De sentido contrário os estados mentais e emocionais de baixa frequência, que produzem sensação de vazio. Podemos dizer cargas positivas para um caso, e cargas negativas para outro. É só uma questão de nomes para o mesmo efeito.


A Bíblia não é a palavra de Deus. Mau era se assim fosse. Não obstante, há nela sabedoria, incluindo logo aquela na abertura (Gn 2) “Então o Senhor Deus declarou: "Não é bom que o homem esteja só; farei para ele al­guém que o auxilie e lhe corresponda". Isto significa a necessidade do outro para que cada um se complemente. O masculino e o feminino, o positivo e o negativo, o Yin e o Yang, a noite e o dia. Um só existe porque o outro também existe. Daí a atracção natural entre polaridades complementares, neste caso, o masculino e o feminino. (Ressalve-se que a polaridade nem sempre está relacionada com o género. É assim que em género feminino pode estar uma polaridade masculina e em género masculino pode estar uma polaridade feminina. 2Isto explica as atracções homossexuais, que não anulam o princípio aqui trazido. Sendo que o Espírito não tem sexo, em condições regulares aquando da encarnação psiquismo e corpo físico ajustam-se, mas há factores que desequilibram este funcionamento regular.) E quando no casal há trocas de fluidos psíquicos, que é muito mais que a troca de fluidos orgânicos, não há solidão que sobrevenha.

Estamos onde estiver o nosso pensamento. Esta afirmativa tem um alcance maior do que supomos, porque se o destinatário do pensamento nos percebe sensivelmente, que é muito mais que a recepção de uma mensagem telepática, algo de nós está presente. As propriedades já conhecidas do perispírito ensejam e explicam uma série de fenómenos, e as faculdades da alma permitem que o Espírito (alma mais perispírito) se projecte para onde a vontade o leva. É assim que podemos entrar em contacto com o campo energético (aura) daquilo ou daqueles em que pensamos e partilhá-los. Se eu penso luz sintonizo luz, se eu penso trevas sintonizo trevas. E estou onde quero estar, a impregnar-me dos fluidos que lá vigem. Por mais voltas que dê não há como fugir a isto. As evidências estão aí. (Os suicídios não acontecem porque sim.)

Há causas, que normalmente transitam de umas existências para outras (a reencarnação é outra lei de que não se pode fugir, por mais que se queira negar, negação esta que só retarda o progresso da humanidade), e entre essas causas há essas ligações que se estabelecem e nas quais nos demoramos. Estamos em rede, sim. Apesar disso às vezes sentimo-nos terrivelmente sós. Às vezes somos telemóveis sem bateria. Ou temos que mudar de sítio para voltar a apanhar o sinal. Como já alguém disse, às vezes falta-nos o endereço de Deus. Endereço esse que, de tão simples que é, os complicativos que somos temos imensa dificuldade em obter.


1 Os seres vivos são sistemas abertos; um sistema aberto troca energia e matéria com tudo o que o rodeia; estas trocas de energia podem ser descritas pelas leis da Termodinâmica.

2 Já os Upanixades, os mais antigos com redacção estimada entre os séculos XVI a VII antes da Era Comum, falam que há em cada ser humano um aspecto feminino e masculino.

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