À Conversa com Espíritos - XV
- Na comparação dos animais e o homem percebe-se que a distinção não está tanto na inteligência, na vontade, no livre-arbítrio e na comunicação, mas encontra-se sobretudo na faculdade que o homem tem de pensar em Deus. Não é diferença pequena, mas quando se diz que “há entre a alma dos animais e a do homem distância equivalente à que medeia entre a alma do homem e Deus” não será exagero? O simples facto de ser capaz de pensar em Deus cria tamanho fosso, ou a afirmação é mais hipérbole e menos realidade?
- Não nos embaraça a questão. A resposta torna-se fácil, basta tomar atenção ao item 607-a) d’O Livro dos Espíritos, que diz o seguinte: «Já não dissemos que tudo em a Natureza se encadeia e tende para a unidade? Nesses seres, cuja totalidade estais longe de conhecer, é que o princípio inteligente se elabora, se individualiza pouco a pouco e se ensaia para a vida, conforme acabamos de dizer. É, de certo modo, um trabalho preparatório, como o da germinação, por efeito do qual o princípio inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito. Entra então no período da humanização, começando a ter consciência do seu futuro, capacidade de distinguir o bem do mal e a responsabilidade dos seus atos.» Fica claro que que a aquisição da inteligência e do que dela resulta não é sujeita a solução de continuidade, pelo que nesse particular não é medonho o abismo que separa os animais do homem (além de que não é no mundo Terra que ocorre o derradeiro estágio evolutivo da alma dos animais, é sim em mundos superiores onde haja encarnação). Mas concentremo-nos no grifo “o princípio inteligente sofre uma transformação e se torna Espírito”. Ora aí é que está o acontecimento estupendo, de que desconhecemos o modo e a substância. De alguma forma há algo de Deus, seja emanação ou seja o que for, que transita para o princípio inteligente e o torna Espírito. O ser é agora divino, é imagem de Deus; logo, a distância para a alma animal é por isso mesmo incomensurável. Pode então doravante ter consciência de si, pode doravante começar a sondar a profundeza dos desígnios de Deus, a Inteligência suprema e Causa primeira, e pode doravante apreciar a sabedoria das leis que regem a harmonia do Universo. Este novel conhecimento só pode aproximar a criatura do criador, porque vai encontrar aquilo que já designa, sobretudo na cosmologia e na biologia, por ajuste fino, que requer um programador sublime. Sim, a Ciência não é um convite ao materialismo e ao ateísmo, muito pelo contrário. Se assim não fora, Deus não houvera outorgado a inteligência nem tornado necessário investigar para O descobrir nas leis naturais. Materialistas existem com ciência ou sem ciência. Tal como orgulhosos. E egoístas. (O progresso intelectual, o desenvolvimento da inteligência, precede o progresso moral porque aquele permite entender a necessidade deste [LE 780 e seguintes]). Quase diríamos que a Ciência é mais propícia a espiritualizar do que qualquer religião, porque o uso da inteligência aproxima de Deus, que não é antropomórfico e, daí, não pode ser descrito com características humanas. Deus deve ser adorado em espírito e verdade – e espírito não é sangue derramado, seja literal ou metaforicamente; verdade tem o significado de apreensão directa da Realidade primordial, e não aquele conhecimento indirecto acerca da Realidade, formulado em frases e aceite na autoridade.
Um behaviorista dirá que não é tão óbvia a diferença entre o animal e o homem quanto a é entre o homem e Deus; realmente assim parece observando os comportamentos, porquanto o homem do mundo Terra ainda se encontra assoberbado pela instintividade primária. Mas é aí que entra o livre-arbítrio e a responsabilidade, porque ao adquirir o distintivo de Espírito é dotado da ferramenta que lhe permite a consciência e a racionalidade. Daí dizer-se que a lei de Deus está escrita na consciência, que o mesmo é dizer que estão inscritas no próprio Espírito. Compete-lhe expandir a consciência, crescer na lucidez, espiritualizar-se, para que diminua a incomensurável distância que na origem o separa de Deus.
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