À Conversa com Espíritos - XX


- No capítulo dedicado à Uranografia, em A Génese, vem uma teoria da Lua que nem de perto nem de longe encontra confirmação na já vasta exploração deste astro. Como não é a única inconsistência da longa explanação, e como esta revelação está em desarmonia com o pressuposto do item 20 d’O Livro dos Espíritos, não poderá dar-se o caso de estarmos perante um pseudo-sábio?

No comentário à questão, Allan Kardec diz que “Por mais racional e científica que seja essa teoria, como ainda não foi confirmada por nenhuma observação directa, não pode ser aceite senão a título de hipótese e como ideia capaz de servir de baliza à Ciência.” Não seria prudente aplicar o princípio a toda o livro?


- Já abordamos em vez anterior a questão da inconsistência nesse tema n’A Génese. Não vamos repetir-nos nem contradizer-nos. Só uma adenda: em As Forças Naturais Desconhecidas, o próprio Camille Flammarion põe em causa a autenticidade mediúnica de Uranografia. Escreve: «Naquelas reuniões na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, escrevi, por meu lado, páginas sobre astronomia assinadas “Galileu”. (…) Essas páginas sobre astronomia nada me ensinaram. Não tardei em concluir que elas eram apenas o eco daquilo que eu sabia e que Galileu nada tinha a ver com aquilo, era como uma espécie de sonho acordado. Além disso minha mão parava quando eu pensava em outros assuntos.»

Posto isto, a resposta de hoje damo-la através de Obras Póstumas, de Allan Kardec. Assim, temos: O Espiritismo, com efeito, não quer que o aceitem cegamente; reclama a discussão e a luz. Em vez da fé cega, que aniquila a liberdade de pensar, diz ele: Não há fé inabalável, senão a que possa encarar face a face a razão, em todas as épocas da Humanidade. A fé necessita de base e esta base consiste na inteligência perfeita daquilo em que se haja de crer. Para crer, não basta ver, é, sobretudo, preciso compreender. [As aristocracias]”; “O terceiro ponto, enfim, é inerente ao carácter essencialmente progressivo da Doutrina. Pelo facto de ela não se embalar com sonhos irrealizáveis, não se segue que se imobilize no presente. Apoiada tão-só nas leis da Natureza, não pode variar mais do que estas leis; mas, se uma nova lei for descoberta, tem ela que se pôr de acordo com essa lei. Não lhe cabe fechar a porta a nenhum progresso, sob pena de se suicidar. Assimilando todas as ideias reconhecidamente justas, de qualquer ordem que sejam, físicas ou metafísicas, ela jamais será ultrapassada, constituindo isso uma das principais garantias da sua perpetuidade. (…) A verdade absoluta é eterna e, por isso mesmo, invariável. Mas, quem poderá lisonjear-se de possuí-la toda? No estado de imperfeição em que se acham os nossos conhecimentos, o que hoje nos parece falso pode amanhã ser reconhecido como verdadeiro [e o que hoje parece verdadeiro amanhã pode ser reconhecido como falso], em consequência da descoberta de novas leis, e isso tanto na ordem moral, quanto na ordem física . Contra essa eventualidade, a Doutrina nunca deverá estar desprevenida. O princípio progressivo, que ela inscreve no seu código, será a salvaguarda da sua perenidade e a sua unidade se manterá, exactamente porque ela não assenta no princípio da imobilidade.[ Dos cismas]

Ainda em Obras Póstumas, mesmo no fim [Princípios Fundamentais da Doutrina Espírita, reconhecidos como verdades inconcussas] vem exarado que “No Congresso espírita e espiritualista internacional de 1890, declararam seus membros que, desde 1869, estudos perseverantes haviam revelado coisas novas e que, segundo o ensinamento preconizado por Allan Kardec, alguns dos princípios do Espiritismo, sobre os quais o mestre baseava seu ensino, tinham de ser revistos e postos de acordo com os progressos da Ciência, em geral, nos últimos 20 anos.

Essa corrente de ideias, comum aos membros daquele Congresso, vindos de todas as partes da Terra, provou que um volume novo precisava ser elaborado, para conjugar o ensino de Allan Kardec com o que nos proporciona constantemente a pesquisa da verdade.”

Ora, já o século XX passou e muitas descobertas trouxe a Ciência e estas, “longe de rebaixá-lo, glorificam a Deus. Elas somente destroem o que os homens construíram sobre as ideias falsas que hão feito de Deus.” Ao tempo, foi alvitrada uma Comissão de Propaganda para efectuar a obra; na verdade, deveria efectuar-se uma revisão periódica e regular para que o Espiritismo não se suicide, nas palavras com que Kardec exprimiu o receio.

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