Música, musicoterapia e sinais dos tempos


Em 2008 a revista científica Brain divulgou um estudo realizado por cientistas da Universidade de Helsínquia com pacientes que sofreram derrame cerebral.

Sessenta voluntários participaram da pesquisa, divididos em três grupos. O primeiro, formado por pacientes que foram expostos à audição musical, por duas horas diárias. O segundo, por pacientes que ouviam livros–áudio. O terceiro grupo não ficou exposto a nenhum tipo de estímulo auditivo.

Após três meses, os cientistas observaram que a memória verbal melhorara 60% entre os pacientes que ouviam música, comparado com apenas 18% do grupo dos livros-áudio e 29% entre os pacientes que não receberam estímulos auditivos. A pesquisa demonstrou ainda que os pacientes que ouviram música durante a recuperação revelaram uma melhoria de 17% na concentração e na habilidade de controlar e realizar operações mentais e resolver problemas.

Teppo Sarkamo, que liderou o estudo, disse que a exposição à música durante o período de recuperação estimula a atividade cognitiva e as áreas do cérebro afetadas pelo derrame, além de ajudar a prevenir a depressão nos pacientes.

A respeito da ação da música, podemos ler na Revista Espírita, Março de 1869, uma página mediúnica, assinada por Rossini, de que se extrai:

E agora, se se considerar que a harmonia sai do conceito do Espírito, deduzir-se-á que, se a música exerce uma influência feliz sobre a alma, a alma, que a concebe, também exerce sua influência sobre a música. A alma virtuosa, que tem a paixão do bem, do belo, do grande, e que adquiriu harmonia, produzirá obras-primas capazes de penetrar as almas mais encouraçadas e de comovê-las. Se o compositor estiver terra-a-terra, como expressará a virtude que desdenha, o belo que ignora e o grande que não compreende? Suas composições serão o reflexo de seus gostos sensuais, de sua leviandade, de sua indolência. Elas serão ora licenciosas, ora obscenas, ora cómicas e ora burlescas; comunicarão aos ouvintes os sentimentos que exprimirem, e os perverterão, em vez de os melhorar.”

Há em musicoterapia1 um princípio que é chamado princípio de Iso (‘iso’, em grego, significa ‘igual’). Esse princípio estabelece que, na abordagem terapêutica, deve ser levado em consideração o tempo mental do cliente. Caso se trate de uma depressão, a música eventualmente empregada deve ter o tempo lento (andantes, adágios etc.). Em se tratando porém de agitação ou mania, o tempo musical há de ser igualmente agitado (alegro, presto etc.)

Pois bem, o princípio de Iso tem caracterizado os vários momentos históricos da Humanidade. Durante a Idade Média, por exemplo, o Iso era, em geral, lento quanto à música sacra e um tanto menos lento quanto à música chamada popular – e a ideia que temos da Idade Média é que foi um período globalmente depressivo. Com o advento da Renascença, deu-se um fenómeno curioso: a música chamada erudita foi-se caracterizando por um tempo cada vez mais rápido até o Barroco/Clássico – e pensamos na Renascença como um período efervescente. A partir daí, o tempo foi ‘ralentando’, ou seja, tornando-se cada vez mais lento. Com a música popular não foi diferente: seus andamentos foram-se tornando cada vez mais rápidos até à chamada Belle Époque do foxtrot, do charleston e outros ritmos; a partir da Segunda Guerra, porém, o tempo musical passa a ‘ralentar’.2

A música, como qualquer manifestação artística, não é mero entretenimento, passatempo, e não reflecte apenas as harmonias celestes. O artista é sim um médium, tanto das inspirações superiores, quanto das angústias e necessidades humanas. A música acompanha o homem em casa ou fora de casa. Ela é o escoadouro natural das forças que dormem tanto no inconsciente individual quando no coletivo.

A música que a esmagadora maioria dos media actualmente massifica é extremamente ruidosa, repetitiva, inquieta e de tempo misto. Que sentimentos, aspirações ou inquietações estará a reflectir? Estão em curso grandes transformações sociais; tal como tudo o que se manifesta materialmente é precedido pela manifestação etérica, e podem por isso ser pressentidas, assim também com as grandes transformações sociais, em que há uma espécie de fermentação, de ebulição a sacudir tanto encarnados quanto desencarnados. Ora, não estará toda esta gama de sensações representada pela música que consumimos?


1 O emprego da música para fins terapêuticos é tão velho quanto o mundo. nos Livros de Samuel (Bíblia hebraica) David tocou harpa para livrar o rei Saul de um mau espírito, e por volta de 400 a.E.C., Hipócrates tocava música para doentes  mentais.

2Luiz Antonio Milleco, Música & Espiritismo

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