Esperança


730. Uma vez que a morte nos faz passar a uma vida melhor, nos livra dos males desta, sendo, pois, mais de desejar do que de temer, por que lhe tem o homem, instintivamente, tal horror, que ela lhe é sempre motivo de apreensão?

Já dissemos que o homem deve procurar prolongar a vida, para cumprir a sua tarefa. Tal o motivo por que Deus lhe deu o instinto de conservação, instinto que o sustenta nas provas. A não ser assim, ele muito frequentemente se entregaria ao desânimo. A voz íntima, que o induz a repelir a morte, lhe diz que ainda pode realizar alguma coisa pelo seu progresso. A ameaça de um perigo constitui aviso, para que se aproveite da dilação que Deus lhe concede. Mas, ingrato, o homem rende graças mais vezes à sua estrela do que ao seu Criador.”


«(…) Sendo bem conhecida a enorme força inata do instinto de conservação, o que fará com que haja pessoas que decidem pôr termo a esse bem precioso, a vida? Não é, certamente, a miséria, a extrema degradação das condições de vida, as agressões e a violência: foram excepcionais os casos de suicídio entre os detidos nos diversos campos de extermínio com que a História ficou tristemente assinalada. Também não são frequentes os casos em que se detecta uma perda, frustração ou revelação de factos socialmente vergonhosos ou marginalizantes, embora a literatura abunde em descrições desse tipo.

(…) Ao contrário do que tem sido por vezes afirmado, é raríssimo o suicídio de pacientes conhecedores da sua condição terminal. Então, qual a motivação para o suicídio? O psiquiatra João Barreto, que dedicou especial atenção ao estudo deste tema, conclui que cerca de 95% dos suicídios ocorrem em pessoas com perturbações psíquicas, nomeadamente do tipo depressivo. De facto, a depressão grave acarreta consigo sofrimento insuportável, ao eliminar da vida psíquica toda a satisfação, interesse, iniciativa e, sobretudo, esperança. Costuma dizer-se que a esperança é a última a morrer, mas no deprimido é a primeira vítima da doença.» - Walter Osswald, Sobre a Morte e o Morrer


Mas há um problema com a esperança: ela não existe por si só; sem a fé não há razão de ser para a esperança. Importa então acreditar em algo, mas há também um problema primário com a fé: perante a razão dificilmente se aguenta. (A fé, normalmente associada a religião, é um apelo que nos fazem para que aceitemos o duvidável, e mesmo o insustentável, a fim de melhor exercerem o controlo das mentes - e das massas.) Este círculo vicioso faz com que o suicídio esteja entre as 20 principais causas de morte em todo o mundo — e seja a segunda causa de morte para os jovens (entre os 15 e os 29 anos) —, provocando mais mortes que a malária, o cancro da mama ou mesmo as guerras e homicídios. O suicídio é, para a OMS, um problema de saúde global.


943. De onde nasce o desgosto da vida, que, sem motivos plausíveis, se apodera de certos indivíduos?

Efeito da ociosidade, da falta de fé e, não raro, da saciedade. Para aquele que usa de suas faculdades com fim útil e de acordo com as suas aptidões naturais, o trabalho nada tem de árido e a vida se escoa mais rapidamente. Ele lhe suporta as vicissitudes com tanto mais paciência e resignação, quanto obra com o fito da felicidade mais sólida e mais durável que o espera.”


944. Tem o homem o direito de dispor da sua vida?

Não; só a Deus assiste esse direito. O suicídio voluntário é uma transgressão da lei divina.”



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