À conversa com Espíritos - III


- Marcianos são seres com corpos constituídos pela matéria de Marte. Sem esse corpo seriam Espíritos, eventualmente em um mundo transitório. Neste pressuposto, temos Kardec a afirmar que os marcianos estão evolutivamente em nível inferior aos terráqueos, e temos vários Espíritos a afirmar pelo médium F. C. Xavier precisamente o contrário. (E diga-se de passagem que o que vale no movimento espírita é a palavra de Xavier e não a de Kardec.) Dado que se contradizem, não podem estar as duas opiniões certas, mas podem estar as duas erradas – e esta é a probabilidade mais forte, atendendo a que, se os governos não estão a ocultar informação, a já considerável exploração de Marte não detectou sinais que façam crer na existência de marcianos. Que devemos entender destas discrepâncias?


- Para bem da verdade, começamos por uma pequena correcção: Kardec não emitiu opinião pessoal, ele cingiu-se à informação dada pelos Espíritos. A nota começa por “Segundo os Espíritos…”. Aceitou-a como plausível porque todos os planetas albergam vida, sendo ela possível nas mais variadas formas e nas condições mais diferenciadas. Tem na Terra exemplos em como a vida pode tomar formas inesperadas, evoluir em lugares imprevisíveis e de formas improváveis – os chamados extremófilos: a bactéria polaromonas vacuolata, que vive sob temperaturas dezenas de graus abaixo de zero; o micróbio methanopyrus kandleri, que vive no interior de vulcões submarinos; o sulfolobus acidocaldarius, que vive em fontes de ácido sulfúrico…

Pensar que a vida orgânica inteligente só pode existir em condições iguais às da Terra é um pressuposto enganoso e redutor, porque apesar da abundância de hidrogénio e de oxigénio em toda a galáxia não tem que ser a água o solvente único, nem obrigatoriamente ideal, para as reacções químicas complexas que levam à vida. Por que não admitir que em planetas sob outras condições a vida pode muito bem acontecer e atingir elevados patamares de inteligência? Não perdeis se lerdes o capítulo VI d’ A Génese.

Está aqui em causa a discrepância entre duas revelações: uma, a partilhada por Kardec, que diz que Marte é um mundo primitivo; outra, a difundida por Xavier, que eleva Marte a um mundo maravilhoso, quiçá feliz. Não sendo possível que um mundo evolua de primitivo a feliz num cento ou dois de anos, uma das teorias está errada. Ou as duas, claro.

Cada um acredita no que quer; a investigação científica decidirá quem está certo e quem está errado, e é por ela que devemos aguardar. Mas se quisermos ser criteriosos não devemos perder de vista: i) que as revelações são excepção e não regra; ii) que por essa excepcionalidade a abundância de revelações torna suspeita a veracidade. Com efeito, tantas e tantas (já excluindo as motivadas pela má-fé) manifestam apenas o desejo do Espírito de como gostaria que as coisas fossem e não como realmente são. Imagina e acredita como real o que imagina; iii) a atracção pela ilusão, pelo fantástico, pelo maravilhoso, do ser humano, que vive em lutas consigo próprio e com o mundo e precisa de algo que sirva de refrigério imediato. Acrescentamos ainda que alguns homens chamaram a si as novas revelações e quiseram fazer um novo espiritismo. Promoveram a divisão.

Mas então, há marcianos ou não há marcianos? A NASA, que é quem mais explora Marte, admite a possibilidade de vida mas, para bem da sua credibilidade e à falta de evidências irrefutáveis, mais não adianta. O que nós podemos adiantar (os Espíritos não sabem tudo e do que sabem nem tudo podem dizer) é que: i) Marte não é um mundo transitório; ii) as humanidades por esse universo fora medem por escalas diferentes; iii) há grande variedade de habitats naturais das humanidades do universo. O que serve para uma não tem de necessariamente servir para outra.

Sendo Marte um mundo primitivo, não é de esperar encontrar o equivalente a cidades e automóveis. Talvez ainda não se tenha procurado nos locais certos com a tecnologia adequada.



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