Mediunidade Inconsciente


            Defende-se a mediunidade inconsciente como a mais fidedigna. É-a no que respeita ao que o comunicante quer dizer, mas também é a que permite ao médium rebolar pelo chão e dizer obscenidades, e eventualmente a que permite ser medianeiro do seu próprio pensamento, sem fingimento em caso de sonambulismo, e com fingimento quando há um propósito menor, em que fica muito conveniente não haver lembrança de nada. Os casos que conheço onde há inconsciência revelam também um descontrolo elevado, o que confere à mediunidade assim manifestada o carácter de patologia, conforme definido pelo CID-10 .

          A finalidade da mediunidade não é, ou não deveria ser, o espectáculo, nem a exposição de excentricidades, nem ainda a vã satisfação de curiosidades, pelo que virem Espíritos facetos com léria na inconsciência do médium nada acrescenta ao conhecimento nem enobrece a fidedignidade.

            Tende a mediunidade a ser cada vez mais consciente1, mas torna-se imperioso que o médium se instrua para que possa ombrear com a fonte e ser o competente primeiro examinador do que lhe chega mentalmente, e também para que esta mudança medianímica, de inconsciente para consciente, continue a processar-se em bom ritmo. Esta aquisição de conhecimento é uma necessidade acrescida, não só pelo motivo exposto mas também pela possibilidade que abre de ser medianeiro de planos mais elevados.

        Passado já o tempo da comprovação científica do fenómeno da comunicabilidade entre “vivos” e “mortos”, não vejo nos médiuns inconscientes grande utilidade. Talvez por isso é que já rareiam. 2

        Inconscientes ou conscientes, os médiuns cumprem a sua função de medianeiros, mas se eles não pretendem ser gurus de uma qualquer iluminação, ou tão somente novidadeiros, e não são capazes de ajuizar o que é razoável, que alguém com discernimento, conhecimento, senso crítico (que é a capacidade de questionar e analisar de forma racional e inteligente) os possa devolver ao lugar a que pertencem. A moda é escrever livros, mas escrever muitos livros pouco significa; a verdade, ou um simples momento libertador, não é necessariamente várias resmas de papel com psicografias.

           Para terminar, duas leituras, à consideração de cada um.

        De Edgar D. Mitchell, em O Espaço Interior (artigo em O Livro dos Poderes do Espírito, coord. Louis Pauwels e Jean Feller):

«A evidência prova que a energia psíquica é neutra, não dando acesso a qualquer sistema de valores. Esta energia tem de ser manipulada com cuidado, porque um desenvolvimento psíquico só por si não origina um crescimento moral ou espiritual. A história da investigação psíquica demonstrou-o uma nova vez, expondo o caso de diversos sensitivos que utilizaram a fraude ou a trapaça. Os investigadores foram, por vezes, desiludidos, no espaço de um momento, em contacto com estes homens e mulheres psíquicos cuja preocupação principal não era agir de maneira ética, de fazer avançar o conhecimento ou de auxiliar os que estavam em necessidade, mas antes de impressionar os outros, de desempenhar o jogo do seu ego e reforçar o seu próprio estatuto social, a sua riqueza e o seu poder sobre os outros.»

        De Grof, S. Journal of Transpersonal Psychology, vol 4., 45-80, 1972):

«No estado de consciência "normal" ou usual, o indivíduo se experiencia como existindo dentro dos limites de seu corpo físico (a imagem corporal), e sua percepção do meio ambiente é restringida pela percepção, fisicamente determinada, de seus órgãos de recepção externa; tanto a percepção interna quanto a percepção das coisas externas do meio ambiente estão confinadas dentro dos limites do espaço e tempo euclidiano-newtoniano. Em experiências psicadélicas, transpessoais e de psicoterapia profunda, ou mesmo através da meditação, uma ou várias dessas limitações parecem ser transcendidas. Em alguns casos, a pessoa experiencia um afrouxamento de seus limites usuais de ego e sua consciência e autopercepção parecem expandir-se para incluir e abranger tudo o que diz respeito a outros indivíduos e elementos do mundo externo. Ele consegue obter informações que, pelos meios sensoriais convencionais, seriam impossíveis. Em outros casos, o sujeito continua experienciando sua própria identidade, mas num tempo diferente, num lugar diferente, ou num diferente contexto, tal como ocorre na chama Terapia de Vida Passada. Ainda em outros casos, o sujeito experiencia um grande identificação com uma omnipresente consciência universal, conseguindo abranger elementos que não têm nenhuma continuidade com sua identidade de ego usual e que não podem ser considerados como simples derivativos de suas experiências no mundo tridimensional.»


1 Temos de entender consciência como “Estado do sistema nervoso central que permite pensar, observar e interagir com o mundo exterior”.

2 O transe de qualquer modalidade (mediúnico, anímico, por hipnose ou decorrente de enfermidade) produz, necessariamente, algum grau de dissociação psíquica que se reflete no cérebro, em regiões específicas. Em certas manifestações mediúnicas e/ou anímicas, como no sonambulismo, o grau de dissociação mental é elevado, produzindo amnésia, parcial ou total, dos factos ocorridos durante o transe.    Situação semelhante (de elevada dissociação) é também encontrada durante a hipnose, magnética ou obsessiva, por efeito de certos medicamentos (psicotrópicos, por exemplo) e em algumas enfermidades (coma diabético, entre outros).

(https://www.febnet.org.br/blog/geral/colunistas/o-transe-mediunico/)


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