Criações fluídicas e Vidência


«O princípio das criações fluídicas parece ser uma das mais importantes leis do mundo incorpóreo. Nos seus momentos de emancipação, gozando a alma encarnada parcialmente das faculdades de Espírito livre, pode produzir efeitos análogos. Aí pode estar a causa das visões ditas fantásticas. Quando o Espírito está fortemente imbuído de uma ideia, seu pensamento pode criar uma imagem fluídica correspondente, que para ele tem todas as aparências da realidade (…).

Todas as visões têm seu princípio nas percepções da alma, como a vista corporal tem a sua na sensibilidade do nervo óptico. Mas elas variam em sua causa e em seu objeto. Quanto menos desenvolvida é a alma, mais susceptível de criar ilusão sobre o que vê. Suas imperfeições a tornam sujeita ao erro. As mais desmaterializadas são aquelas cujas percepções são mais extensas e mais justas.» (RE, Agosto 1866)


A mente é um mundo misterioso, que antes de se afirmar na plenitude gloriosa passa por complexos processos de aprendizagem e depuramento, dos quais faz parte a deformação da realidade. Não é obrigatório que aconteça, mas não se exclui. Constrói as denominadas realidades intra-mentis, fruto da imaginação, e que, portanto, guardam diminuta ou nenhuma relação com o exterior, que se para o próprio tomam aspecto de concreto e indubitável, para um observador terceiro é óbvia fantasia, mas também pode, sob certas circunstâncias, dar-lhes materialidade e animação1.

Para melhor entendermos este processo criativo, leiamos: Ocupemo-nos agora do segundo efeito do pensamento: a criação de uma forma definida. Todos os que têm estudado o assunto que nos ocupa, sabem o que é a essência elemental, essa estranha manifestação semi-inteligente que nos rodeia, vivificando ao mesmo tempo a matéria do plano astral e do plano mental. Essa matéria se amolda muito facilmente à influência do pensamento humano. Todo impulso que brote do corpo mental ou do corpo astral, cria imediatamente uma espécie de veículo temporário, que se reveste dessa matéria vitalizada. Assim, um pensamento ou um impulso se converte durante determinado tempo numa espécie de entidade vivente, cuja alma será a forma de pensamento, e a matéria vivificada, o corpo." (Formas de Pensamento. Besant, Annie e Leadbeater, C.W.)

Nesta espécie de teatro de sombras podemos introduzir as dinâmicas obsessivas,2 porque a imaginação pode ser sobreexcitada por agentes externos a ponto de impressionar os sentidos e provocar toda a sorte de estímulos físicos, assim como nas emoções elas vivenciarem-se em torno da ilusão como se existisse um objecto causal real.

Conhecedores das idiossincrasias, esses agentes fazem manipulação psicológica usando o pensamento e a vontade, mas também fazem uso de sofisticada tecnologia fluídica para produzir estímulos electromagnéticos sobre áreas específicas do cérebro, que espoletam factos mediúnicos fantasma.3

Como o cérebro não diferencia realidade de imaginação, se a pessoa está sob alguma forma de obsessão pode bem confundir real e imaginário, tomando uma coisa pela outra, atendendo sobretudo aos enlaces emocionais que caracterizam os vínculos entre imaginação e realidade.

E como essas criações fluídicas se reflectem no invólucro perispiritual como em um espelho (OP, Fotografia e telegrafia do pensamento), essas imagens podem estar presentes nos sonhos, porque a eles podem ir com vida própria isso que só pensamos, e aqueles serem tomados por revelações espirituais.

Fica a questão para já sem resposta: daquilo que é relatado pelos videntes, quanto é criação da mente do vidente, a laborar num determinado sistema de crenças e desejos, e quanto é exterior ao seu mundo íntimo e independente das suas vontade e imaginação?

Pode este assunto tornar-se ainda mais complexo de trouxermos para aqui aquela situação de todos os dias em que duas ou mais pessoas a relatarem o mesmo acontecimento o fazem em versões com diferenças substanciais, e tantas contraditórias, julgando, porém, cada uma ser fidedigna em relação à realidade única do evento. Há apenas deformação interna no processamento da informação, ou há tantas realidades quantos os olhares, por força das criações introduzidas pelo ser pensante? A ser deste último modo as consequências são estruturais (e dramáticas) porque, no limite, invalidam a concepção maniqueísta do mundo e a teologia do sofrimento, já que o que é bem para um é mal para outro (e este é exemplo dado pela natureza nas relações entre os seres vivos), e, portanto, as categorias de pensamento relacionadas com o bem e o mal perdem valor moral absoluto e todas as acções ficam aparentemente justificadas.


1 Ernesto Bozzano relata em Pensamento e Vontade o caso da materialização de uma cabeça que era um esboço de reprodução plástica da cabeça de S. João, do pintor Rubens, que a médium havia contemplado admirativamente, alguns dias antes, no museu do Louvre. Relata outros episódios de materialização de coisas só pensadas, o que revela a força da ideoplastia e que algumas vezes faz tomar por fenómeno espírita o que é tão somente fenómeno anímico, pese embora a validade de ambos.

2 Conhecidas são as seguintes técnicas obsessivas: persuasão, influenciação telepática, hipnotismo, soldadura perispirítica, infecção fluídica, manipulações ectoplásmicas, provocação de reflexos anímicos, provocação de efeitos sensitivos particulares. (Zalmino Zimmermann, Teoria da Mediunidade)

3 “Importa frisar que nos repositórios de comunicações mediúnicas, desde Allan Kardec a Stainton Moses, encontram-se mensagens de entidades espirituais com alusões à possibilidade de formas fantasmáticas, ou assombrações, que são puras formas de pensamento. Esta possibilidade é também confirmada em certos casos, a posteriori, pela contraprova da identificação pessoal da forma-pensamento percebida.” (Ernesto Bozzano, Pensamento e Vontade)

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