À Conversa com Espíritos - XVIII


- O ESE, cap. V, 9, diz, entre outras coisas, que ”Provas e expiações, todavia, são sempre sinais de relativa inferioridade, porquanto o que é perfeito não precisa ser provado. Pode, pois, um Espírito haver chegado a certo grau de elevação e, nada obstante, desejoso de adiantar-se mais, solicitar uma missão, uma tarefa a executar, pela qual tanto mais recompensado será, se sair vitorioso, quanto mais rude haja sido a luta.” Se Jesus era um Espírito perfeito, o que aqui é dito não é verdadeiro; se o que aqui é dito é verdadeiro, Jesus não era um Espírito perfeito. Em que ficamos?


- Visto assim é efectivamente um paradoxo. Na tentativa de o resolver surgem duas opiniões. Uma, muito partilhada, diz que, em absoluto, não precisava de sofrer, por ser uma pessoa do Deus trino, mas que tomou o sofrimento dos homens, fruto do pecado, para os remir. (Existe um número incontável de Espíritos da mais elevada perfeição, os quais numa concepção trina de Deus têm de ser considerados segundas pessoas. Um absurdo.) Ora, esta opinião diminui, se não anula, a necessidade de esforço individual para um objectivo maior definido como salvação. É cómodo, e irresponsável, mas não corresponde à realidade verificada pela experiência mediúnica (relatos dos Espíritos) e pelo que a reencarnação implica (evolução); outra, diz que Jesus não teria tido um corpo carnal, mas apenas um corpo fluídico; não teria sido, em toda a sua vida, mais do que uma aparição tangível; numa palavra: uma espécie de agénere. Seu nascimento, sua morte e todos os actos materiais de sua vida teriam sido apenas aparentes” [Gn XV, 64], o que só reformula a opinião anterior e é dolo, porque uma farsa não pode servir de exemplo de resignação. Kardec desmonta a conjectura na Génese [XV, 65-66]. Esta opinião, reintroduzida ao tempo de Kardec, e ainda com seguidores, inclusive no movimento espírita, teve início no século IV E.C.

No meio da banalidade qualquer um que sobressaia facilmente é elevado à categoria de herói ou deus [cf. LE, 668]. Não é preciso muito para lhe erigirem estátuas e altares. Quanto mais servir um interesse mundano, como o poder, mais o culto a prestar-lhe é incentivado. Prefere-se a criatura em detrimento do criador, talvez porque à criatura lhe vêem as mãos, ou seja, há uma necessidade de concreto, que decorre do poder limitativo da ignorância, que faz tomar o efeito pela causa. Num mundo materialista e doente um ser espiritualizado causa pasmo; nos mundos de onde são enviados para estimular o progresso não ser espiritualizado impossibilitaria a permanência.

A encarnação na Terra de um Espírito dos mundos divinos não seria útil aos homens porque deles em tudo destoaria e de todo não o compreenderiam, nem útil ao Espírito porque os fluidos grosseiros que o envolveriam lhe provocariam um sofrimento que nada lhe aproveitaria. Sendo a Terra um mundo assaz atrasado, representaria um desperdício de recursos enviar-lhe para o seio Espíritos cuja elevação os torna necessários a tarefas à altura da sua envergadura. Cada coisa no seu plano e com a sua compatibilidade. Em reforço de tese, adimos o que vem n’O Livro dos Espíritos [item 113] que diz que os Espíritos puros tendo alcançado a soma de perfeição de que é susceptível a criatura, não têm mais que sofrer provas, nem expiações, e não estão mais sujeitos à reencarnação em corpos perecíveis.

Posto isto, diremos com Léon Denis [No Invisível] que Jesus foi “vidente e inspirado, o maior de quantos o sopro divino vivificou em sua passagem pela Terra”; ainda assim, a despeito de ser um Espírito superior e missionário, pertencia à segunda ordem [item 111] e esteve abrangido pela regra descrita na transcrição com que iniciam a pergunta.


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